segunda-feira, 2 de maio de 2022

Amores Perros

Maru em muito breve é uma quarentona. 


Mas hoje é segunda-feira e ela não trabalhou (não “in loco”, já que, enquanto descansa, carrega pedras - sua mãe dizia sempre). Abriu uma garrafa de vinho sozinha (!) - ainda que a rolha insista em não sair do saca-rolha de dois braços. Tomou quase toda, sozinha - ainda que com água e um chocolate amargo porque hoje ainda é segunda-feira.


Achou por acaso (acaso?) o filme que procurava há anos. calhou de estar sozinha. sem pendências do trabalho. garrafa de vinho aberta. 


Assistira a “Amores Perros” quando tinha vinte e poucos anos. bem poucos. Era um VHS. Pirateado. Gravado sabe-se lá como pelo ex-namorado. Legenda em português de Portugal. Não lembrava de quase nada, nestes quase quarenta.


Bom filme. Bem ao seu sabor. Vai recomendá-lo ao marido e à irmã que logo vai embora. À amiga que divide gostos artísticos e à comadre. Esses cabem na história e poderão dividi-la em entendimentos. Esses são seu clube. 


Pensou que talvez tivesse descoberto por que o ex gostava de “Amores Perros” - ele tinha um cão bravo. bem bravo, preto. um pitbull talvez? (como era mesmo o nome?… Ozzy! Claro! Como esquecer? O cantor preferido do marido, o cão do ex…) e era sobrinho do marido da mãe - igual ao filme. Muito se explica. Freud explica, diriam.


Maru só explica sua vontade de ir embora (explica?). Hoje, segunda-feira, Maru queria não pensar que seu trabalho não a deixa ver os dias correrem, nem o sol alaranjar o céu, embora pegue sua contas - e o chocolate, e o filme, e até o vinho que bebeu quase todo; queria não pensar que amanhã o dia de trabalho começa (muito) cedo e não tem hora pra acabar; queria não pensar nas eleições presidenciais e na campanha estranha que vem fazendo seu candidato, embora vote nele sempre e sempre; queria não pensar que está há anos afastada do que pode ser ela mesma enquanto o marido estuda e se apaixona pelo que faz (como um dia também ela se apaixonou) e pela vida que tem; queria não pensar em ir embora, como estão em movimento forte as suas (queria?).


a vida é um amontoado de amontoados. aqui e por lá e por aí… Maru tem guias e guianças vários (leu essa palavra hoje. achou bem forte). Maru segue caminhos que ela traça e trava. 


“Também somos o que perdemos” e Maru não quer perder mais nada. 


Maru é filha do pai guerrilheiro no filme. 


Maru, aqui, sou eu.


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